Filhos e educação financeira: como conciliar?

Especialista diz qual a idade certa para falar de dinheiro com os filhos e explica porque a educação financeira vem sendo abordada em escolas e nas empresas e, em muitas famílias, ela não consegue entrar. Dois exemplos ilustram os desafios de se educar filhos mostrando esses valores.

“A educação financeira é uma ciência humana. Muitas pessoas acreditavam que, por lidar com números, ela era da área de Exatas, mas não é. Acima de tudo, ela lida com comportamento e com mudança de hábitos”, afirma Reinaldo Domingos, doutor em Educação Financeira, presidente da Associação Brasileira de Educadores Financeiros e autor de vários livros, entre eles “Terapia Financeira” e “Mesada Não É Só Dinheiro”.
Cada vez mais disseminada nas escolas e nas empresas, aos poucos, a educação financeira vem sendo abordada dentro das famílias e ajudando-as a melhorar as questões de “endividamento”. De acordo com dados do Banco Central, em julho deste ano, este endividamento foi o menor desde 2011.
Manter as contas em dia não é tarefa fácil. Por isso, aprender desde cedo como planejar e gastar o próprio dinheiro é dever das famílias. Afinal, “é de pequenino que se torce o pepino!”

Estipulando as prioridades

Viviane Giroldo, a Vivi, tem 10 anos e desde muito pequena aprendeu o valor de cada aquisição. De acordo com sua mãe, a jornalista e professora universitária, Laura Barcha, “falar de dinheiro aqui em casa é uma coisa muito natural. Eu sempre falei para ela sobre os custos das coisas porque eu acho que os filhos têm que saber”, relata. “Assim, a gente começa a mostrar a eles que as coisas têm valores. Por exemplo, quando a Vivi diz: ‘eu quero tal coisa’. Eu explico que não temos o dinheiro para comprar agora. E também, não é só o ‘não ter o dinheiro agora’, mas é apresentar as prioridades. Com tudo isso, ela aprendeu que eu trabalho porque existe a questão financeira envolvida.”
Laura explica que sempre deixou os assuntos bem claros: “não é porque ela é filha única que eu devo fazer o gosto dela o tempo todo. Como a minha área é Marketing, eu aproveito para explicar para ela o ‘poder das propagandas e do marketing’, e o incentivo exagerado ao consumo. Acho que este também é meu papel como mãe e como docente.”
E essa didática é extremamente válida. Segundo Reinaldo, quando a criança ainda é muito pequena utilizar-se de artifícios como a “Árvore dos Sonhos” ou os “cofrinhos” auxilia e muito na redução dos gastos. “A falta de sonhos é um dos maiores problemas para não se ter planejamento. Os sonhos são objetivos a serem conquistados no curto, no médio e no longo prazo. Quando fazemos isso estipulamos as prioridades, tanto na vida quanto no orçamento financeiro”, ressalta, acrescentando que a “Árvore do dos Sonhos” é uma forma lúdica de representar, nas folhas da árvore desenhada, os sonhos e o que já foi feito para conquistá-lo.
Os objetivos podem ser viajar com a família, fazer um curso no exterior ou comprar a casa própria. Não importa o sonho, os filhos têm de participar.
“No Natal, geralmente, a gente faz um esforço maior. Mas em outras datas comemorativas, costumo ‘por o pé no freio’ e não se render aos apelos comerciais”, conta Laura. “Outro exemplo que acontece aqui em casa é em vez de ganhar presente, fazemos um passeio ou uma viagem, até para desvincular essa coisa de ganhar presente. A Vivi sabe que ela tem um limite e que eu sou rigorosa”.
A filha dá sua versão: “Às vezes, eu fico um pouco triste quando ela fala que não dá para comprar alguma coisa, mas entendo que se ela falou ‘não’ é porque não temos esse dinheiro agora; e ela está certa!”, diz Viviane.

 

Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar

Na família de Niliane Costa Mendonça existe uma flexibilidade maior em relação às finanças. Ela é mãe do pequeno João Lucas e diz que nem sempre é possível falar de valores com ele, afinal, ele só tem 4 anos. “Eu não dou tudo o que ele pede, claro. Mas às vezes, a gente faz o gosto dele sim. Não porque ele é filho único, mas porque é muito novo para aprender sobre questões financeiras”, argumenta Niliane.
Para o especialista, o período ideal é a partir dos dois anos de idade. “Toda a família deve se envolver nessa missão. Isso porque os pais de hoje costumam ser pessoas que não tiveram essa oportunidade nas escolas. Então, buscar essa inserção da disciplina dentro da sala de aula, influenciar as escolas e mostrar que educação financeira não é apenas números e cálculos, mas sim mudança no comportamento é o melhor caminho”, destaca Reinaldo.
“Hoje, nós estamos construindo em casa, então, a economia é grande. Mas quando não estávamos, geralmente, atendíamos os desejos do João Lucas. Na verdade, eu até segurava um pouco, falava de guardar dinheiro no cofrinho, por exemplo; mas quando ele pedia ao pai, ele acabava cedendo”, conta Niliane.
Reinaldo reforça que a postura dos pais é fundamental para que a criança entenda que guardar dinheiro ou não gastá-lo à toa é dever de todos os membros da casa, inclusive das crianças. “Pais precisam do empoderamento financeiro. A ausência deles não pode ser compensada por dinheiro, por bens ou por brinquedos”, sentencia. “Outra coisa é a ‘Mesada Social’: curtir seu filho, doar seu tempo, dar carinho e atenção, intensificar as brincadeiras e ter mais contato pessoal. Tudo isso faz com que ele se sinta amado e realizado e entenda o valor dos sonhos”.

  • Ao lado da mãe, Vivi aprendeu desde cedo o valor de cada compra
  • Quando os filhos são muito pequenos, os pais podem adotar três “cofrinhos”: um para abrir em curto prazo (3 meses); um em médio (6 meses) e um em longo prazo (acima de 6 meses).
  • João Lucas: economizar ainda não é prioridade
  • João Lucas entre os pais Niliane e João Otávio Basílio