Proseando : MEDITAÇÃO

Alberto Wladimir Cardoso foi a primeira pessoa a acertar o enigma do último Proseando. Respondeu “Pindamonhangaba” e ganhou ocordel “Um caso de amor na Parada Vovó Laurinda”. (A letra inicial de cada parágrafo formava o nome de nossa cidade). Parabéns, Alberto!
Agora chegou a sua vez. Descubra porque o mineirinho errou o local da meditação. Quem primeiro enviar a resposta correta ao WhatsApp 99735-0611, ganhará um brinde surpresa.

MEDITAÇÃO

Tenho um amigo mineiro. Viúvo.Gente boa, mas muito ansioso. Coração generosíssimo.Cruzeirense doente. Mora na Serra da Saudade. Só sai da tocauma vez na vida e outra na morte. De vez em quando consigo falar-lhe ao telefone. Ele não gosta. Prefere o tête-à-tête.
Semana passada, pela primeira vez na vida, ele se modernizou: pegou o celular da filha e me ligou, desesperado. Contou que a vizinha, também viúva, estava se engraçando com ele. “Ela é bunidimais, sô! Táquerenoforunfácoeu, mais só dispois de nóis secasá”.
Contou-me que ela fez outras exigências: que ele tomasse banho pelo menos duas vezes por semana; que parasse de coçar a bunda, de cuspir no chão e, principalmente, que controlasse a ansiedade. Ele me ligou dizendo que controlar a ansiedade era quase impossível. Pediu-me ajuda. Sugeri que fizesse meditação, que, se quisesse, poderia meditar comigo. Passei-lhe o endereço na Mooca, em São Paulo: Rua São Rafael, 606. Marcou apenas o número, pois a rua tinha o nome dele e ele jamais a esqueceria.
No dia combinado, devido ao acúmulo de trabalho, cheguei atrasado à meditação. Fiquei do lado de fora. Ao fim da sessão, procurei por ele entre os participantes. Não estava. Decidi ir embora. Estava abrindo a porta do carro quando ouvi meu nome. Era ele, carrancudo, apontando-me o indicador e rasgando o verbo. Estava furioso. Cuspindo vitupérios relatou que chegara pela manhã e, à primeira pessoa que encontrou, perguntou: “Oncotô?”.
– Terminal Rodoviário Tietê. Para aonde o senhor vai?
– Proncovô?
Ele citou a rua e o motivo. Orientaram-no a pegar a linha vermelha do metrô. Ele fez tudo direitinho, ou quase. Encontrou a rua e caminhou até o número que anotara no papelzinho. Era um galpão marrom, pichado, fechado, implorando reforma. Havia pequena porta semiaberta. Ele se aproximou, abriu-a e encontrou um corredor escuro. Caminhou por ele, ouvindo vozes. Na metade do corredor havia porta que dava acesso ao grande salão iluminado por velas. Nele, viu o homem gordo, vestindo mawashi, no centro, circundado por outras pessoas com vestes estranhas. Ao vê-lo, o homem gordo encostou o indicador no nariz, exigindo silêncio. Com outro gesto, fê-lo se sentar. E ordenou:
– Fechem os olhos. Vamos ouvir o silêncio!
Meu amigo fechou um olho só. Viu, ao lado, o jovem que esfregava as mãos na barriga e suava. Travava luta difícil e interminável até ser vencido pelos gases estomacais. O ruído foi condenatório. Se o som metralhador fosse inodoro, talvez o ritual tivesse continuado. Entretanto, a mistura de ovo cozido com repolho contaminou o local.
Meu amigo terminou a narrativa, pondo fim em nossa amizade.
Naquele mesmo dia descobri o que aconteceu e o porquê do equívoco. Ele entrara num ensaio teatral. Desde então, tenho tentado, em vão, me comunicar com ele.