História : O velho chalé francês

Construído na segunda metade do século XIX, a inesquecível edificação conseguiu resistir ao avanço do progresso que substitui o velho pelo novo, até a segunda metade do século XX…

Denominado “chalé francês”, ficava na esquina da rua Deputado Claro Cesar com a Marechal Deodoro e até o início dos anos 60 ainda não havia sido demolido. Segundo José Renato San Martin, em “Pelas Ruas de Pindamonhangaba” (JAC-Gráfica e Editora, 1995), “pela sua arquitetura leve e graciosa, construído em 1881, esse chalé encantou durante muitos anos os que por ali passavam”.

Artigo de Nini Salgado (Tribuna do Norte, 11/10/1970), descrevendo a rua Deputado Claro César, a autora revela, “…ali residiram primeiramente o casal José Antonio Teixeira Salgado e Clélia Prado Salgado e depois dona Gabriela de Barros Lessa, a dona Bey, mãe do dr. Francisco Lessa Júnior, médico e ex-prefeito de Pindamonhangaba”.

No entanto, a memória dessa linda casa, até hoje admirada e comentada graças às fotos e ilustrações da Pindamonhangaba antiga, ficou eternizada em um poema de Maria Carmelita Gama Romeiro, professora e poetisa que integrou os quadros da APL – Academia Pindamonhangabense de Letras, e nos deixou no ano de 2006.

Sob o pseudônimo de Marecê, Maria Carmelita escrevia poesia e prosa. Testemunha da vida que pulsara no interior do chalé quando lá vivera com membros de sua família, ela, há 55 anos, assim cantou nas páginas do jornal Tribuna do Norte a velha e aconchegante casa:

Velho Chalé

Fui rever o meu chalé tão lindo…
Seus quartos e salas percorrendo
…a saudade de manso vem surgindo
e um passado gostoso vou vivendo!

Ali no quarto grande logo vi
linda velhinha, era a vovó Bey
nos dando, que delícia! Quinhentão!
que tirava dum canudo de latão…

Mamãe, bonita, doce e carinhosa
a lidar, bordar e desenhar;
no fogão a fazer coisas gostosas,
ou na sala um sapatinho a tricotar.

Papai, gordo, barulhento, e bondoso
pai e avô dedicado e carinhoso,
tia Má, tia Ziza, tia Zazá…
quanta saudade nos traz a velha casa!

Chalé, testemunha de meus ais…
Dos suspiros de meu amor primeiro…
Amor seguro, forte, verdadeiro,
dedicado ao meu terno companheiro.

Depois… num passado mais recente,
vem surgindo gente nova, diferente;
são crianças alegres e ligeiras
a saltar, a gritar em brincadeiras.

São gritinhos, risos e folguedos,
algazarras, correrias e brinquedos…
…o velho chalé vivendo aquilo
com seu ar austero e tão tranquilo.

Hoje estão te destruindo!…
Que revolta e amargura vou sentindo
de casa a escutar as marteladas
que ressoam em meu peito qual pancadas…
Pancadas misturadas aos passinhos
suaves, delicados da avózinha…
ao barulho calmo e ao trabalhar
da máquina de mamãe a costurar…

Aos gritinhos alegres das crianças,
aos passinhos saltitantes a cantar…
Tudo, tudo ficou lá para traz
e não volta mais… nunca mais!

Velho chalé, estão te destruindo…
tuas tábuas na carroça vão saindo…
Chão de meu velho chalé…
chão de lágrimas da morte de vovó,
regado do sangue de mamãe,
molhado no xixi dos meus filhinhos
e também de meus queridos sobrinhos…

Estão te destruindo!…
é o progresso que vem vindo!…
Estão te destruindo!…
Mas, de meu peito,
de nenhum jeito
ninguém destruirá aquela fé
que herdei de mamãe no meu chalé!!!

Marecê,
Tribuna do Norte, 31/3/1968

O moderno e o antigo

O assunto sendo as construções da Pinda antiga, históricas ou não, há sempre a possibilidade de um novo olhar, nova constatação: a de que em Pindamonhangaba ainda pode-se contemplar exemplos de coexistência do moderno com o antigo. Motivo de satisfação para alguns, se levarmos em conta que em qualquer parte do mundo as especulações imobiliárias tem ocasionado o desaparecimento das construções antigas, que acabam substituídas por prédios modernos a pretexto e em nome do progresso.

Numa ligeira abordagem referente à arquitetura residencial de Pinda, considerando àquelas ocorridas em favor do desenvolvimento do município, citamos, além do chalé francês, pelo menos mais duas (houve mais) perdas historicamente contundentes: o sobrado dos irmãos Marcondes(em frente à praça Monsenhor Marcondes, esquinas da Deputado Claro Cesar com a rua dos Andradas), onde pernoitou D. Pedro I em passagem por Pindamonhangaba rumo a Santos, cavalgada que resultaria na proclamação da Independência, demolido em 1940; o solar de Francisco Marcondes Romeiro, construção que ficava na rua dos Andradas, altura da entrada do Centro Comercial 10 de Julho, demolida no final dos anos sessentas do século passado.

Mais que exemplares que possibilitam avaliar a pluralidade arquitetônica ou as transformações ocorridas devido às reformas públicas, as antigas edificações da Pinda antiga que ainda ficaram para contar história são cenários preservados, guardam memórias, resquícios existenciais, fatos, feitos e costumes. Daí a importância da utilização dos mesmos na atividade turística amparada em planejamento criterioso. O retorno vai além da geração de recursos econômicos, haja vista que a manutenção dos pontos determinados como de interesse turístico resulta na defesa e valorização do próprio patrimônio histórico e cultural.

  • Reprodução. O velho chalé francês segundo reprodução do artista pindamonhangabense Hélio Hatanaka
  • Arquivo TN. Na foto (esquerda pra direita), os saudosos membros da Academia Pindamonhangabense de Letras, inesquecíveis intelectuais de Pindamonhangaba: escritor e advogado, coronel (herói da 2ª Guerra Mundial) Túlio Carvalho Campello de Souza; professora e escritora, EloynaSalgado Ribeiro; professora e articulista do jornal Tribuna do Norte, Julieta RealeVieira e, concluindo o valioso retrato, a professora, escritora e poetisa Maria Carmelita Romeiro Ramos Mello