Editorial : Frio, tempo seco e possibilidade de vacina fazem pessoas ‘relaxarem’ em relação à dengue

Mesmo com a chegada do inverno, que começou no último dia 20, a preocupação com a dengue não pode diminuir. Muita gente não sabe, mas a estação que registra menor número de casos é ideal para intensificar o trabalho de prevenção do aparecimento de focos do Aedes aegypti nas residências. Forma mais eficaz de combater a doença, a eliminação dos criadouros feita nesta época do ano garante um próximo verão livre de uma epidemia. Segundo especialistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), apenas dez minutos semanais de checagem podem afastar o perigo. A recomendação vale para o ano todo.
“Este é o momento de agir e impedir que a doença volte com força nas próximas estações. Os ovos do A. aegypti resistem a longos períodos de dessecação, que podem durar até um ano. Para a larva eclodir, basta que o ovo entre em contato novamente com a água”, explica a pesquisadora Denise Valle, chefe do Laboratório de Fisiologia e Controle de Artrópodes Vetores do IOC. “Esta resistência é uma grande vantagem para o mosquito, pois permite que os ovos sobrevivam por muitos meses em ambientes secos, até o próximo período chuvoso e quente”, completa a especialista.
O alerta é sempre válido, principalmente porque recentemente a interpretação de notícias sobre a vacina contra a dengue ‘amoleceu’ a já ‘fraca’ vontade do brasileiro de atuar para eliminar focos criadouros do mosquito da dengue.
É bom deixar claro que as vacinas da dengue ainda estão sendo testadas e que o acesso das pessoas ao produto pode levar anos.
Na semana passada, por exemplo, o Estado de São Paulo informou que irá levar os testes em humanos da primeira vacina brasileira contra a dengue, produzida pelo Instituto Butantan, unidade da Secretaria de Estado da Saúde, para mais três cidades brasileiras.
Desde quinta-feira (23), os estudos começam a ser realizados em cerca de 1,2 mil voluntários de São José do Rio Preto, em parceria com a faculdade de medicina local.
Já esta semana, os testes serão iniciados em centros de pesquisa dos municípios de Manaus-AM e Boa Vista-RR.
Trata-se da última fase da pesquisa em humanos antes da aprovação da vacina para produção em larga escala pelo Butantan e disponibilização para campanhas de imunização em massa na rede pública de saúde em todo o Brasil. Ao todo, serão mobilizados 17 mil voluntários em 14 centros de pesquisas situados em 13 municípios pelo país.
Os ensaios clínicos desta etapa foram iniciados em fevereiro deste ano, pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, na capital paulista.
São convidadas a participar do estudo pessoas saudáveis, que já tiveram ou não dengue em algum momento da vida e que se enquadrem em três faixas etárias: 2 a 6 anos, 7 a 17 anos e 18 a 59 anos. Os participantes do estudo são acompanhados pela equipe médica por um período de cinco anos para verificar a duração da proteção oferecida pela vacina.
A vacina do Butantan, desenvolvida em parceria com o National Institutesof Health (EUA), tem potencial para proteger contra os quatro vírus da dengue com uma única dose e é produzida com os vírus vivos, mas geneticamente atenuados, isto é, enfraquecidos. “Com os vírus vivos, a resposta imunológica tende a ser mais forte, mas como estão enfraquecidos, eles não têm potencial para provocar a doença”, explica o diretor do Instituto Butantan, Jorge Kalil.
Nesta última etapa da pesquisa, os estudos visam a comprovar a eficácia da vacina. Do total de voluntários, 2/3 receberão a vacina e 1/3 receberá placebo, uma substância com as mesmas características da vacina, mas sem os vírus, ou seja, sem efeito. Nem a equipe médica nem o participante saberão quais voluntários receberam a vacina e quais receberam o placebo. O objetivo é descobrir, mais à frente, a partir de exames coletados dos voluntários, se quem tomou a vacina ficou protegido e quem tomou o placebo contraiu a doença.
Os dados disponíveis até agora das duas primeiras fases indicam que a vacina é segura, que ela induz o organismo a produzir anticorpos de maneira equilibrada contra os quatro vírus da dengue e que ela é potencialmente eficaz.
“A dengue é uma doença endêmica no Brasil e em mais de 100 países. A vacina brasileira produzida pelo Butantan será uma importante arma de prevenção para que o país possa delinear estratégias de imunização em massa, protegendo nossa população contra a doença e suas complicações, afirma o secretário de Estado da Saúde, David Uip.
Enquanto este processo lento, não por morosidade do Estado ou dos pesquisadores, mas porque é o procedimento adequando de acordo com a Organização Mundial da Saúde, não chega ao fim, todos devem contribuir para eliminação dos focos criadouros.
Como alerta, podemos dizer que ‘não é porque existe vacina contra gripe que você deve ficar exposto à doença’. Prevenção é o melhor remédio.