Risco de morte por febre amarela pode ser identificado mais cedo

Estudo verifica perfil de paciente mais sujeito a problemas por causa da doença e pode contribuir para diagnóstico precoce

De cada 100 pessoas picadas por mosquitos infectados com o vírus da febre amarela, cerca de 10% desenvolverão sintomas da doença. Embora a maioria dos infectados com o vírus da febre amarela não desenvolva a doença, cerca de 40% dos que apresentam sintomas acabam morrendo.
“Muitos pacientes que dão entrada no sistema de saúde com diagnóstico de febre amarela ainda não estão muito doentes. Vários chegam caminhando ao hospital, mas o que se observa nos dias seguintes é um quadro de piora acentuada, que muitas vezes leva ao óbito”, disse Esper Kallás, professor titular do Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
“Ainda não se conheciam vários marcadores que pudessem ser empregados pela equipe médica para avaliar o prognóstico de cada paciente, permitindo identificar quais seriam os pacientes com mais chances de evoluir para um quadro de maior gravidade e poder tratá-los de acordo com tal prognóstico, elevando as chances de tratamento e cura”, afirmou Kallás.
Esses marcadores acabam de ser identificados e descritos em artigo na revista The Lancet Infectious Diseases. Assinam o artigo Kallás e outros 19 pesquisadores ligados à FMUSP, ao Instituto de Medicina Tropical (IMT) da FMUSP, ao Instituto de Infectologia Emílio Ribas e ao laboratório Diagnósticos da América (Dasa). O trabalho teve apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) por meio de projeto de pesquisa coordenado pela professora Ester Sabino, diretora do IMT e professora no Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da FMUSP.
Análise de casos
O objetivo do estudo foi identificar os preditores de morte medidos na admissão hospitalar em um conjunto de pacientes internados no Hospital das Clínicas da FMUSP e no Instituto de Infectologia Emílio Ribas durante o surto de febre amarela de 2018 na periferia da cidade de São Paulo. Entre 11 de janeiro e 10 de maio de 2018, 118 pacientes com suspeita de febre amarela foram internados no Hospital das Clínicas e outros 113 pacientes no Emílio Ribas.
Após uma triagem para a confirmação do diagnóstico, o estudo foi resumido a 76 pacientes (68 homens e 8 mulheres) com infecção confirmada pelo vírus da febre amarela, com base no RNA do vírus da febre amarela detectável no sangue (74 pacientes) ou no vírus da febre amarela confirmado apenas no laudo da autópsia (dois pacientes). Dos 76 pacientes, 27 (36%) morreram durante o período de 60 dias após a internação hospitalar.
Marcadores da doença
Os pesquisadores identificaram que a febre amarela tende a ser mais grave quanto mais velho é o paciente. “Trata-se de um aspecto intuitivo. Faz sentido que os idosos sofram mais e tendam a ter um desfecho pior. Quanto mais velho o paciente, maiores são as chances de o quadro piorar”, constatou Kallás.
Outro marcador de severidade é o aumento da carga viral no sangue dos pacientes. “Assim como ocorre com a idade avançada, parece lógico pensar que quanto maior for a quantidade de vírus no sangue, pior será o prognóstico do paciente. Mas é a primeira vez que alguém descreveu isso em um estudo”, destacou.
Por outro lado, os pesquisadores constataram que a coloração amarelada na pele dos doentes, tão característica que está no nome da doença, não é um marcador de severidade no momento da entrada do paciente no hospital.
“A coloração amarelada, consequência da destruição das células do fígado pelo vírus, só aparece em casos de piora avançada. Em nosso estudo, nenhum dos pacientes que vieram a óbito chegou ao hospital ostentando coloração amarelada”, afirmou Kallás.