Lembranças Literárias : Chove

Chove,
A vidraça chora.

O vento põe no parque um soluço de outono.
Range uma porta e bate, e parece que implora
Numa voz de abandono…
Chove…

Dir-se-ia que milhões de alfinetes acertam
Nos vidros frios e se espetam.
Chove,
A vidraça chora.

O céu esconde a última nesga azul que existe,
Sob um manto cinzento e móvel.
Chove:
A vida é triste!

– Que importa!
Ulule o vento, bata a porta
E tombe a chuva!
Que importa!

Tenho nos olhos um clarão que nada turva;
Tenho na vida um céu azul e imóvel;
Tenho na alma um jardim ondulante de palmas
Balançadas em pleno anil por brisas calmas:
Eu penso nela!

Chove…
– E a vida é bela!

Jornal Tribuna do Norte, 28/8/1965, poeta francês Fernand Gregs (tradução de Guilherme de Almeida)

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