Lembranças Literárias : Chove
Publicada dia 21 de novembro de 2019
Chove,
A vidraça chora.
O vento põe no parque um soluço de outono.
Range uma porta e bate, e parece que implora
Numa voz de abandono…
Chove…
Dir-se-ia que milhões de alfinetes acertam
Nos vidros frios e se espetam.
Chove,
A vidraça chora.
O céu esconde a última nesga azul que existe,
Sob um manto cinzento e móvel.
Chove:
A vida é triste!
– Que importa!
Ulule o vento, bata a porta
E tombe a chuva!
Que importa!
Tenho nos olhos um clarão que nada turva;
Tenho na vida um céu azul e imóvel;
Tenho na alma um jardim ondulante de palmas
Balançadas em pleno anil por brisas calmas:
Eu penso nela!
Chove…
– E a vida é bela!
Jornal Tribuna do Norte, 28/8/1965, poeta francês Fernand Gregs (tradução de Guilherme de Almeida)