História : Relembrando as proibições do Eden
Da Pindamonhangaba dos românticos anos vintes trazemos hoje uma notícia relacionada àquele que teria sido o primeiro cinema da cidade. Denominado Eden Cinema ou Cine Eden, foi espaço de lazer e cultura da Pinda antiga muito lembrado em gostosas crônicas por articulistas de indiscutível talento tais como: escritor Jannart Moutinho Ribeiro, professor Pedro Silva Junior, Vasco Cesar Pestana, professor Moacyr de Almeida, romancista Hilda Cesar Marcondes da Silva, escritora Heloyna Salgado Ribeiro. Autores locais que viveram os gloriosos dias de fama e sucesso do Eden.
Com o interesse de manter “a ordem, a decência e a moralidade durante os espetáculos” desse estabelecimento, que também servia de teatro e de salão para memoráveis festejos de momo, o delegado Dr. Ayres Bastos solicitou fosse publicada no jornal Tribuna do Norte as disposições do decreto 1714 de 18 de março de 1909:
Art. 27 – É vedado o ingresso nas casas de divertimentos públicos às pessoas embriagadas, às que se apresentarem com falta de asseio, às que não observarem os preceitos da decência e as que, por qualquer modo, incomodem os espectadores.
Art. 29 – Ninguém pode perturbar a representação ou impedir os espectadores de ver ou ouvir o espetáculo anunciado.
Art. 30 – É proibido aos espectadores das galerias vaiar ou dirigir gracejos aos espectadores da platéia, frisas ou camarotes.
Art. 33 – É proibido fumar no interior do teatro, ou casa de divertimento público.
Art. 38 – Em caso de grave perturbação da ordem, a autoridade policial pode determinar a suspensão do espetáculo.
Art. 45 – Os espectadores deverão: parágrafo 3º – permanecer em atitude correta durante o espetáculo; parágrafo 4º – não praticar atos que incomodem aos outros; parágrafo 5º – não fazer motim ou assuada nem praticar quaisquer atos que interrompam o espetáculo ou possam comprometer a ordem e a segurança pública.
Art. 46 – As autoridades encarregadas da inspeção dos espetáculos deverão: parágrafo 11º -fazer retirar do recinto os espectadores que se portarem de modo inconveniente, bem como os que estiverem embriagados ou perturbarem a ordem e a tranquilidade pública; parágrafo 18 – fazer evacuar o recinto pela força, quando isso for necessário para restabelecimento da ordem.
Encerrando a divulgação o delegado destacava: “A Delegacia de Polícia sabe que se dirige a uma população notoriamente culta e educada; apenas por um desencargo de consciência faz esta publicação para que não haja alegação de ignorância das disposições regulamentares quando, em casos que certamente serão exceções, tiver de agir, o que aliás, fará com máxima energia”.
O delegado foi atendido pela edição de 11/4/1920 da Tribuna. Aqui é oportuno acrescentar que o decreto 1714 de 18 de março de 1909 foi um ato do Executivo do governo do Estado de São Paulo, que havia sido publicado na edição do Diário Oficial do Estado, edição de 21 de março de 1909.
Éden, o primeiro cinema de Pinda
Em Pindamonhangaba Através de Dois e Meio Séculos (1922), Athayde Marcondes registra que o Éden era a denominação de um grande pavilhão situado na praça Monsenhor Marcondes, inaugurado em 30 de dezembro de 1909. “Era bastante tosco, sem conforto nenhum, mas seu próprio o tornou mais confortável e elegante. Mandou ladrilhá-lo, construiu camarotes, substituiu bancos e cadeiras toscas por outras envernizadas”.
Era propriedade de Antonio Alves Moutinho. Foi construído no teatro onde antes existia o prédio do Teatro Municipal de Pinda. Sua localização, de acordo com diversos autores sobre o assunto, devia ser onde atualmente se encontra a Caixa Econômica Federal.
Jannart Moutinho Ribeiro, em crônicas publicadas na Tribuna do Norte em 1971, cita filmes inesquecíveis ali exibidos, tais como: Luzes da Cidade, Tempos Modernos, Robin Hood, O Ladrão de Bagdá, A Marca do Zorro, Dom “Q”, o filho do Zorro, O Médico e o Monstro, Bem Hur, O Sheik, Nosferatu, Sangue e Areia, Beau Geste, O Vampiro de Dusseldorf, Ana Bolena, Amores de Faraó, Os Miseráveis, Dr. Fausto, Nero, Cabíria, O Gabinete do Dr. Calegari, etc.
As fitas em série também são citadas por Jannart Moutinho: “havia fitas com até quinze episódios, sempre interrompidos com cenas perigosas, nas quais o mocinho e a mocinha corriam perigo. Que acontecerá a Fulano? Ele se salvará? Volte na próxima semana!!! E a gente, chovesse canivete aberto, voltava. E voltava numa excitação desgracenta da vida. Que bons tempos não voltam mais…”
Casa de espetáculos
Athayde Marcondes lembra que, apesar de não ter acústica o cine Éden era local de apresentações de algumas companhias. Afirmação confirmada por Jannart quando recorda: “por volta de mil novecentos e trinta e poucos ali se exibiu uma trope que tinha de tudo, palhaços, anões, mágicos e dramalhões, e também uma companhia de cossacos que fez estrondoso sucesso e foi motivo de piadas sem fim”.
Há também recordações que durante o carnaval eram suspensas as sessões cinematográficas para a realização de bailes e folguedos dos mais animados, “com ruidosas batalhas de confete e serpentina, coisa que ia madrugada afora”. Fato também relembrado em crônica de Eloyna Salgado Ribeiro em seu livro A Vida nos Balcões da Velha Pindamonhangaba (Gráfica Ativa, Taubaté, 1997).
O cine Éden funcionou até o início dos anos 40, sendo seu sucessor o cine Brasil.