Proseando : CHÁ DAS DUAS

As irmãs,de muitíssimas primaveras,se encontraram para o chá semanal. A mais longevaembrulhava a tristeza em sorrisos plastificados.
— Almerinda, minha irmã. Faz tempo que tenho notado.
— Notado o quê, Consuelo?
— Um profundo pesar nesses seus olhos.
Almerinda desviou o olhar para a xícara de chá.
— Os olhos são portais do coração, maninha. E os seus estão cheios de tristeza.
— Bobagem.
— Eu conheço você. E aposto que sei o motivo.
Silêncio.
Almerinda segurou as mãos de Consuelo e disse:
— É, minha irmã. Não consigo esconder nada de você. Você me conhece muito bem. Sabe tudo, ou quase, sobre mim. Sabe que sou uma pessoa difícil, que sou orgulhosa, que sou…
— Você melhorou bastante.
— E de que adianta? Agora é tarde demais.
Consuelo procurava palavras para acalentar a irmã, mas não se satisfazia com as quais encontrava. Continuou ouvindo.
— Fui tola. Ele era um homem bom, dedicado, meu romântico das orquídeas e margaridas. Ele era o meu poeta.
— Não sei o que dizer.
— Ele cuidava muito bem de mim. Me massageava para aliviar minhas dores, lia livros para eu dormir, me amava com amor, me levava de cavalinho… Acredita nisso? Certa vez, subiu três andares comigo às costas, pois meus joelhos estavam travados e o elevador quebrado.
— Atitude de um cavalheiro.
— O que ele sempre foi. Ele cuidou de mim com muita dedicação até o dia em que eu o mandei embora por um motivo fútil. Como fui tola. Não o tratei como ele merecia. Não percebi que estava sendo manipulada por entidades sombrias.
— O que passou, passou. Você ainda o ama?
— Preciso dizer?
— Então, minha irmã, o que está esperando? Não importa quanto tempo se passou. Não importa a distância. Vá procurá-lo e dizer que ainda o ama, que quer viver com ele.
Consuelo se levantou e puxou a irmã pelas mãos.
— Vamos!Você sabe onde ele mora? Eu vou com você.
Os olhos de Almerinda transbordaram.
— Esqueça, irmã. Hoje ele mora na mansão dos mortos.

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