Vanguarda Literária : A FORÇA DA PENA DE UM ESCRITOR
Dizem a que a pena de um escritor pode demolir o império de qualquer tirano. Eu acredito nessa verdade pelo que eu pude testemunhar.
Era o ano de 1975, eu contava com 27 anos de idade e era um jovem médico em estudos de pós-graduação, residindo no Instituto Fernandes Figueira , um tradicional HOSPITAL MATERNO-INFANTIL localizado em uma área nobre do Botafogo, no Rio de Janeiro, que sempre atendeu a população pobre da Cidade Maravilhosa. Certo dia, causou espanto e preocupação, não só para nós, os Médicos-Residentes, mais de quarenta, que fazíamos o nosso aperfeiçoamento em diversas áreas como Pediatria, Ginecologia, Obstetrícia, Cirurgia Infantil e Patologia, bem como para os médicos, pesquisadores e funcionários, o comunicado do Presidente da Fundação Oswaldo Cruz, entidade mantenedora do Hospital, de que o Hospital iria fechar as suas portas por conta de forte crise econômica. Comentava-se que havia um forte interesse das incorporadoras imobiliárias naquela área, e que ali seriam construídas torres residenciais de alto padrão.
Numa tarde, a então Diretora do Centro de Orientação Juvenil (C.O.J.) do Hospital, a psicóloga pernambucana Therezinha Lins de Albuquerque, irmã do político de grande prestígio: Etelvino Lins, ex-Governador de Pernambuco, chamou-me ao seu gabinete (eu era o Chefe dos Médicos- Residentes) e designou-me para uma secreta missão: levar ao conhecimento do prestigiado escritor CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE a real situação do Instituto Fernandes Figueira para que ele nos ajudasse. Fui a Copacabana, onde ele morava, e, na hora aprazada, aquele homem sisudo e de poucas palavras me recebeu , notando o meu evidente nervosismo, ofereceu-me um copo de água e me deixou à vontade para falar. Permaneci com ele por uma hora aproximadamente. Confesso que fiquei com medo pois vivíamos os anos de chumbo da ditadura militar. Cordialmente me agradeceu e nos despedimos.
Na terça-feira (dia em que ele publicava a sua esperada e apreciada crônica) o Jornal do Brasil mostrava na página dois a crônica intitulada:” Salvem o Fernandes Figueira!”
O efeito foi imediato: caíram o Presidente da Fundação Oswaldo Cruz, sua arrogância e sua equipe! O Hospital permaneceu e permanece de pé, até hoje, salvando crianças e mães cariocas. CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE salvou um hospital! Só mais tarde é que tomei consciência de que eu tivera contato (o primeiro e único) com um dos maiores escritores do nosso país.