Proseando : AMOR INSUBSTITUÍVEL
Amei Eugênia durante os oito anos de convivência. Morávamos aos pés da Mantiqueira, numa casa de madeira, avarandada, circundada por margaridas. Possuíamos poucos móveis, rústicos, mas todos nos confortavam ao fim do dia.
Antes de o galo cantar eu me punha a enxadar o pedaço de terra que havia comprado com as economias de muito tempo. Arrancava o mato, arava a terra e semeava. Era maravilhoso observar o milagre da brotação: a semente soterrada abrindo espaço, oferecendo seu primeiro verdor. Quantos milharais plantamos juntos! Eu cavoucava, jogava dois ou três grãos de milho e Eugênia cobria as covas.
Fomos muito felizes. Nunca, em nenhuma circunstância ocorreu algum tipo de rusga entre nós. Nunca! Nunquinha! Éramos parceiros. Éramos amigos. Éramos fiéis. O amor entre nós nunca foi maculado.
Quantas vezes rolamos na grama, abraçados, depois de correr um atrás do outro, ou atrás de passarinhos! Quantas vezes brincamos de esconde-esconde. Brincadeira pueril? Ah, meus amigos. A vida de vocês seria muito melhor se jamais abandonassem a criança que foram.
Nos fins de tarde, eu dedilhava a viola, compondo canções para reinaugurar a lua. Eugênia contemplava o céu. Seus olhos eram duas estrelinhas, as mais lindas entre todas as que Deus criou. Saudade é um punhal que rasga a alma.
Amei Eugênia durante oito anos. Faz três que ela se foi. Doença maldita. Levei-a aos melhores especialistas, mas nenhum deles foi capaz de salvá-la. Ela sofreu. Sofreu muito. Gemeu madrugadas inteiras. Sofri com ela. Muitas vezes pedi a Deus que a poupasse e que me levasse ao invés dela. Mas Deus não me ouviu. Briguei com Ele. Disse-lhe impropérios. Tolice! Dizem que Deus sabe o que faz. Espero que saiba mesmo. Espero que possa reencontrá-la depois do meu último sono.
Eugênia! Meu verdadeiro amor. Por mais que o tempo tente, não consegue amansar a saudade; não consegue impedir que os rios desçam de meus olhos com a mesma intensidade do dia fatídico.
Emagreci. Amarro minhas calças com um fio de corda. Minhas camisas ficaram enormes. Pareço uma espiga de milho embrulhada de qualquer jeito. Um espantalho.
Há meses não me barbeio. Há meses não ponho o pé na rua. Há meses não me banho. Como um punhadinho de nada quando a fome esperneia. Estou fraco. Trêmulo. O mato tomou conta do meu pedacinho de terra.
Eugênia, onde quer que esteja, saiba que você é insubstituível. Não haverá outra em seu lugar.
Eugênia, minha querida cachorrinha vira-lata.