História : Agostinho, o San Martin que inventava
Estação Pindamonhangaba! Maio de 1901. Foi quando Agostinho San Martin Filho pisou pela primeira vez em Pindamonhangaba. Na época, Agostinho não tinha ainda cinco anos, seu irmão Nicolau estava com treze e a pequena Nina, que na verdade chamava-se Esperança, contava apenas com um ano e meio. Eram a riqueza, a posse maior do casal de imigrantes espanhóis, Agustin San Martin Aldea e Bárbara Martin Carretero, que, esperançosos, desembarcavam em Pinda porque o dinheiro não dera para chegar em Guaratinguetá conforme pretendiam. Nem por isso diminuía-lhes a disposição para o trabalho, a garra espanhola de vencer, prosperar.
E seria em terras da Princesa do Norte, histórico município do médio Vale do Paraíba, que Agostinho, o Tininho, se tornaria um respeitável e honrado pindamonhangabense. Cidadão daqueles que embora não naturais do município, devido à dedicação e boa vontade para trabalhar na terra que os acolheu, provaram que prata de fora também reluz, tanto ou mais que a da casa.
Em Pindamonhangaba cresceu trabalhando o Agostinho; tornou-se industrial, comerciante, construtor e até vereador, mas se destacou mesmo foi como inventor. Embora seus estudos não tivessem ido além do curso primário, era dotado de invejável inteligência. Seu talento para consertar e criar máquinas que pudessem facilitar a produtividade no ramo comercial, elevava o nome do município muito além. A imprensa local e a de fora comentava e elogiava suas criações.
Máquina San Martin
Com o título, “Máquina San Martin”, o jornal local Folha do Norte, em sua edição de 12/1/1930, publicava nota divulgando que Agostinho havia obtido na exposição da Semana do Trigo o grande prêmio para a Máquina de Abrir Pães. De sua invenção e fabricação, era a única no gênero destinada a abrir a massa do pão, sem o contato com as mãos. Ressaltava o informativo que a tal máquina interessava ao departamento da fiscalização e higiene de gêneros alimentícios, que iria obrigar sua adoção em todas as padarias. Uma de suas filhas, a escritora Júlia San Martin Boaventura, em seu livro “Uma Família Espanhola”, publicado em 1995, lembra que “uma dessas máquinas foi adquirida por um tal Diego de Angelis, que a levou a Argentina e lá a patenteou, em 1930, substituindo-lhe o nome San para Sian”. Na Argentina, segundo Júlia, a máquina não obteve a aceitação necessária porque os padeiros não tiveram a orientação correta de seu manejo nem a assistência mecânica”.
A autora revela que por causa da exigente burocracia brasileira, “só em 26 de outubro de 1933 foi expedida a patente da invenção, já com certos aperfeiçoamentos”.
Em artigo (editorial) publicado no jornal 7 Dias de maio de 1982, com o título “Conflito entre o Trabalhador e a Máquina”, o jornalista Anibal Leite de Abreu (1917 – 1996), genro de Agostinho San Martin Filho, relembrou o gênio inventivo do “seu” Tininho e suas dificuldades para “bancar” suas invenções.
Sobre a máquina, comentou que “todas as padarias, tanto as das capitais, como as do interior, queriam adquirir a milagrosa modeladora, que, em muito reduziria os custos da produção”.
O sucesso de aceitação por parte dos proprietários de padarias causaria efeito contrário entre os empregados em estabelecimentos do gênero, pois, conforme Anibal, “cada modeladora deixava no desemprego seis, sete ou dez homens que, inconformados, começaram a sabotar e dificultar o funcionamento de tais máquinas”. O expediente que usavam para isso consistia em colocar parafusos, pregos e outros pedaços de metal no meio da massa. Isso ocasionava a paralisação das modeladoras. Para reparar os estragos da máquina, seu inventor era solicitado e “todo o seu tempo era ocupado em consertos aos danos causados, criminosamente, frutos do medo e da ignorância”
Máquina de fazer café
O jornal Correio de São Paulo, na edição de 26/11/1934, noticiou outro invento de San Martin. Com o título “O café e as máquinas para seu preparo”, e o complemento: “Um problema definitivamente resolvido com um invento de um industrial pindense”, aquele jornal assim descrevia a máquina de coar café do San Martin, denominada ‘Bandeirante’.
“Consiste em um caldeira aquecida à eletricidade com todos os aperfeiçoamentos modernos, tendo em redor 12 coadores de pano que, à medida do necessário vão sendo carregados a quantidade precisa de pó para cada xícara e aptos para receberem água fervendo por intermédio de uma torneira. Na medida que se efetuar a coagem de uma xícara de café, as restantes vão rodando num tabuleiro em volta da caldeira, as xícaras acompanham a rodagem dos coadores, facilitando o funcionamento da máquina, que pode ir coando uma após outra sem ser preciso esperar que a xícara anterior fique pronta”.
Na época, outros jornais da região comentaram o fabuloso invento do San Martin. Em Pindamonhangaba, a Tribuna do Norte, na edição de 28/10/1934, destacou: “O aparelho difere das afamadas máquinas tipo ‘expresso’, que produzem café sob pressão de vapor em vasilhame de cobre, desnaturando o seu sabor e dando à bebida um paladar lembrado a metal”.
Divulgou-se o invento e suas qualidades em padarias e bares de Pindamonhangaba, Guaratinguetá, Caçapava, Taubaté e outras cidades, sempre convidando a clientela a conhecer o aparelho e saborear um gostoso café.
Em sua obra citada anteriormente, Júlia San Martin registra que essa máquina começou a ser idealizada em 1931, passando por inúmeros aperfeiçoamentos e modelos e sendo patenteada em 1935.
Os inventos de Agostinho San Martin Filho se por um lado traziam-lhe reconhecimento junto ao meio industrial e empresarial, ressaltando sua capacidade e inteligência, nunca resultaram em sucesso financeiro.
Júlia San Martin conta que os empreendimentos do pai exigiam tempo, elaboração de plantas, contratos, advogados, registro de patentes, ações contra aproveitadores, consertos de máquina e despendiam muito dinheiro. Por conta disso, houve um tempo que até a casa de dona Bárbara, mãe do inventor, chegou a ser hipotecada ao Dr. Francisco Lessa Júnior, o Dr. Lessa.
O jornalista Anibal Leite de Abreu, no artigo já referido, recordou que no caso da modeladora de pães, aconteceu de um invento quase levar o seu inventor à falência. “Se não fora a sua fibra de grande trabalhador, apoiado em sua santa mãe, pela sua esposa e por suas filhas, que o ajudaram a reconstruir tudo quanto ele havia perdido na realização de um ideal”.
Este ano o dia 9 de novembro marcará os 120 anos de nascimento de Agostinho San Martin Filho: um homem que merece ser lembrado como cidadão trabalhador que sempre foi e pela significativa dedicação ao município de Pindamonhangaba.
Uma rua localizada no bairro do Crispim, residencial Crispim – Fabrilar, recebeu a denominação Agostinho San Martin Filho pelo decreto municipal nº 1.385, artigo 13º, de 22/10/1975, que, em comemoração ao ano do sesquicentenário da Corporação Musical Euterpe, homenageou 14 músicos com denominações em uma praça e em 13 ruas do município.
Agostinho San Martin Filho
Filho de Agustin San Martin Aldea e Bárbara Martin Carretero, nasceu em São Paulo, capital, em 9 de novembro de 1896, e teve quatro irmãos: Nicolau, Esperança, João José e Henrique (estes últimos, pindamonhangabenses natos). Casou-se com Maria Benedita Cabral e constituiu sua própria família com a vinda das meninas: Dirce, Helena, Elza, Ignez e Júlia.
Foi dos mais populares comerciantes de Pinda. Seu primeiro estabelecimento comercial foi o Bar Avenida, situado ao lado do antigo Cine Éden, com frente para a praça Monsenhor Marcondes. Posteriormente, foi proprietário de uma padaria, bar, lanchonete e bomboniére na esquina da rua dos Andradas com a Deputado Claro César.
Em 1944, depois de desligar-se das atividades comerciais se destacou no ramo da construção civil como diretor da Construtora Pindamonhangaba Ltda. Esta companhia reuniu cerca de 30 acionistas e levantou prédios e residências que, segundo sua filha Júlia, “mudaram a feição de nossa cidade, destacando-se as construções do antigo prédio do Posto de Saúde (na rua Visconde de Pindamonhangaba), a conclusão do próprio Mercado Municipal e o prédio do Lar Irmã Júlia.
Em 1955 retornou ao comércio, instalando a firma San Martin & Leite de Abreu, a Indústria e Comércio de Panificação San Martin, em parceria com seu genro Anibal Leite de Abreu.
Foi vereador, exercendo o mandato de 1948 a 1951. Integrou a secular Corporação Musical Euterpe nos tempos em que o maestro era o inesquecível João Antonio Romão, começou no triângulo, passou para o prato, flauta e por último, ao saxofone.
Deixou o plano terreno no dia 16 de novembro de 1969
Fonte: Uma Familia Espanhola, de Júlia San Martin Boaventura, 1995