História : As touradas das tardes domingueiras no Largo do Teatro
Nossa página de história desta edição traz recordações de um espetáculo realizado região central da Pindamonhangaba do início do século XX, no antigo logradouro conhecido como Largo do Teatro.
O evento, segundo o jornal Tribuna do Norte (7/10/1905), fora uma exibição de tauromaquia, as famosa touradas, muito comuns na época. O palco da atração, segundo o redator da Tribuna, foi o redondel do Largo do Teatro. Redondel era um espaço fechado destinado aos animais designados para o espetáculo. Instalação que possibilitava melhor contato dos animais com os treinadores participantes. O Largo do Teatro abrangia a atual rua Dr. Jorge Tibiriçá. Sua denominação se dava ao fato de nessa via pública se localizar o prédio do teatro. Edificação que ficava no espaço hoje ocupado pela agência da Caixa Econômica Federal.
A Tribuna do Norte definia o evento como uma boa oportunidade para os populares, os “apreciadores da bela arte de marialva”, assistirem a mais uma corrida de touros. No entanto, o próprio articulista diminuí o entusiasmo da definição acrescentando: “Não vá julgar quem nos lê que a tourada em si fosse de primeira ordem, não foi, mas foi uma tarde alegre, verdadeiramente alegre, não só por causa dos episódios picarescos que se desenrolaram durante a corrida, como pelas piadas esfuziantes daqui e de acolá.”
Aqui é oportuno um esclarecimento ao leitor: “arte de Marialva”, segundo pesquisa, era uma arte equestre apelidada com essa denominação porque sua origem vinha do fato do 4º Marquês de Marialva (Portugal), Dom Pedro de Alcântara de Meneses, estribeiro-mor de Dom José I, considerado o melhor cavaleiro de Portugal na segunda metade do século XVIII, ter sido exímio artista nessa prática em sua alta escola de cavalaria.
Dando prosseguimento à narração, o autor conta que “a casa estava cheia de modo que o nosso público levou o seu apoio a empresa touromáquica que de bons momentos lhe tem proporcionado”. E usando da adjetivação comumente utilizada pelos cronistas (algo poetas) das antigas redações, segue seu comentário: “…era realmente deslumbrante o efeito produzido pela variedade de toalete ostentadas pelas senhoras que das arquibancadas assistiam à corrida, dando nota chic ao mesmo tempo alegre do atraente espetáculo”.
E acrescenta: “Feitas as cortesias com o costumado brilho, tomados pelos artistas os seus devidos lugares e apetrechos de combate, saiu à arena o simpático Antonio Corajoso que, com arrojo e arte toureou a primor o cornupeto saído da sala dos sustos. Manoel, o bandarilheiro de merecimento, que estava numa das suas tardes mais felizes, enfeitou com quatro ferros bem rematados e que tiveram o luzimento que era de desejar”. Contrário a qualquer ação que maltrate, machuque os animais, questiono a insensibilidade da definição “enfeitou com quatro ferros bem rematados…”
Sentimentos à parte, segue a matéria contando sobre o espetáculo na velha Pindamonhangaba: “Antonio Corajoso, o destemido toureiro que tem feito jus ao merecido cognome tentou por duas vezes pegar a fera bravia, a mais bravia dentre as que tem pisado naquela arena, mas seu trabalho foi infrutífero, o animal era de farta cornadura, não podendo por isso o valente pegador segurá-lo, sendo também improfícua a segunda tentativa e talvez ainda tivessse pegado se não fosse a grita dos populares e a arrogância de alguns esbirros que não queriam terceira pega supondo que o extraordinário toureiro não se equitasse tão bem”.
Se os animais, às vezes, escapavam de seus algozes, não escapou um gracejo irônico do redator da Tribuna na época, referindo-se ao pedido de um cidadão, entusiasta daqueles shows com touros, que “mandou pegar o bicho”. Ao cidadão, talvez um seu conhecido, ele argumentou: “É que o inefável aficionado julga naturalmente que fazer uma pega é o mesmo que tomar uma branca ali no Amadei”. Certamente o “ali no Amadei” era uma menção à loja de bebidas dos italianos, irmãos Amadei. Casa comercial muito frequentada da Pinda antiga.
E daquele espetáculo dedicado à arte de tourear ou de correr dos touros, no qual a Pinda antiga lembrava um pouco a velha Espanha, ainda descreveu: “O segundo boi foi lidado por Manoel e Pedro, o engraçado palhaço que o trabalhou bem de capote; como este animal negasse a ser pegado sentado , ou de joelhos como era desejo de Corajoso foi pegado mesmo à unha, valendo-se dessa pega calorosos aplausos…
“O terceiro boi esteve ‘bom’, conseguindo Corajoso fazer, com sua costumada elegância, uma bonita pega sentado que lhe mereceu uma ovação, este bicho depois de capeado por Manoel e Pedro foi montado por este. O quarto e último animal, foi finalmente, para os amadores que, confiantes na magrezado bicho, não se mantiveram à respeitosa distância das duras hastes do animal com sucedeu em uma das últimas vezes, havendo quem se atrevesse a montá-lo e até… pegar, proporcionando, entretanto, francas gargalhadas pelas correrias que o animal, que apesar de ser um depósito de ossos ambulantes, os obrigava sempre que se investia”.
Concluindo o artigo, exaltando a boa impressão causado por aquela, que seria a penúltima corrida da temporada, o redator TN destacou uma premiação ocorrida durante a atração: “Em meio da tourada, o empresário sr. Antonio Gonçalves, o Corajoso, pediu permissão para oferecer ao seu companheiro de lide, senhor Manoel Alves Ferreira, em benefício de quem era o espetáculo uma artística medalha, agradecendo-a, a pedido do beneficiado. A generosa oferta, num brilhante improviso o sr. Oscar Varela”.