Proseando : BALADA À LUZ DE VELAS

O segredo deveria ter sido guardado a sete chaves. Entretanto, alguém abriu o bico sem querer. O colaborador que ouviu, levou a informação à direção, e a direção não a valorizou.

No dia seguinte, ao se aproximar de um burburinho, o mesmo colaborador ouviu sobre uma reunião que aconteceria para acertar detalhes. Prevendo novo descrédito dos superiores, resolveu agir por conta própria.

No início da noite encerrou o expediente, bateu o cartão de ponto, mas não foi embora. Escondeu-se na lavanderia e esperou que seu substituto os colocasse para dormir. Assim que o silêncio vigorou, foi investigar.

Caminhou pelos corredores em penumbra. Espiou um quarto. Espiou outro. Não havia ninguém. Onde estaria todo mundo? Caminhou mais um pouco e percebeu que no fim do corredor havia iluminação precária. Vinha da capelinha. Sorrateiro, aproximou-se e viu os internos segurando velas que diluíam a escuridão. Tirou o celular do bolso e começou a gravar.
— Tudo certo, então. Balada no domingo. Meia-noite. Refeitório.
Era a prova que precisava.
No dia seguinte, mostrou a gravação ao diretor.
— Tenho pena deles. A reclusão não é fácil. Mas não posso admitir bagunça. Imagine se esses malucos têm algum aparelho para reproduzir funk, rock e rap capaz de ensurdecer a vizinhança!
— O que o senhor quer que eu faça?
O diretor entrelaçou as mãos às costas, na região da cintura, e caminhou pensativo, de um lado para o outro.
— Já sei! Faça o seguinte: deixe uma mangueira estrategicamente posicionada. Assim que começarem a balada, encharcaremos a alma deles.

Na noite do evento, diretor e colaborador estavam posicionados atrás das cortinas. A aparição dos farristas não demoraria.
Pontualmente, uma procissão de velas surgiu no corredor e caminhou até o refeitório. Os caminheiros, com pacotinhos na mão, se dividiram em grupos e se posicionaram debaixo das mesas, onde depositavam as velas. Diretor e colaborador não compreendiam o que estava acontecendo. De repente, um assovio iniciou o evento.

Balas de todos os sabores foram arremessadas na direção das velas com a finalidade de derrubá-las. Venceria o grupo que conseguisse manter a vela intacta e em pé.

— Quer que eu ligue a mangueira? — sussurrou o colaborador.
— Não. Vamos embora. Eles precisam se divertir um pouco. Amanhã o pessoal da limpeza arruma isso.
Foi a primeira balada naquele hospício. E o primeiro incêndio também.

  • Maurício Cavalheiro ocupa a cadeira nº 30 da APL - Academia Pindamonhangabense de Letra