Ele abandonou o Santos de Pelé
Após ser artilheiro em todos os times e campeonatos disputados, aos 18 anos o atacante Tija foi levado por Zito – grande amigo de seu pai (Ranulfo) ao Santos ‘de Pelé’ e de um poderoso esquadrão, para fazer testes. Ele conseguiu o desejo de qualquer jogador de futebol ao ser aprovado no ataque do time, mas rejeitou e preferiu voltar para casa.
A desistência de atuar ao lado de Pelé, Dorval, Mengal, Coutinho, Pepe, Zito e outros foi devido à saudade que sentia da família. “Eu fui como atacante e meu irmão Zezé como volante. Ele sempre gostou de futebol muito mais do que eu. Eu jogava por jogar; ele queria ser profissional. Eu fui para o Santos porque meu pai queria e porque o Zito ficava insistindo. O Zezé era diferente. Ele ficava rezando toda a noite para ser aprovado. O futebol era a vida dele”, relembra Tija.
Depois de algumas semanas chegou o resultado da ‘peneira’ santista. “Eu passei e meu irmão não. Quando me chamaram para dar a notícia eu fui até a sala da diretoria e depois voltei cabisbaixo pelo corredor antes de encontrar meu irmão. Quando eu olhei para ele, ele estava de novo rezando com o terço na mão para ser contratado. Eu não tive coragem de ficar em Santos e ‘abandonar’ o Zezé. Dai voltamos para casa e eu menti para meu pai que teria uma outra ‘rodada’ de testes e que o Santos ia chamar”.
Algum tempo depois de Tija retornar, ainda sustentando a mentira, Zito encontrou com Ranulfo e deu uma bronca: “porque você não libera o Tija?”, questionou. Meu pai respondeu: “Como assim liberar? Ele está esperando vocês chamarem”, retrucou Ranulfo. Neste momento, Ranulfo descobriu a verdade, mas conversando com Tija, xingou o filho, porém entendeu os motivos.
Mesmo não tendo ficado na equipe da Vila Belmiro, Tija se recorda com alegria dos momentos que passou por lá. “Além do futebol e de treinar com todos aqueles jogadores, o ambiente era gostoso. O Pelé, por exemplo, me chamava de Roseira, ele era divertido, gostávamos da sala de jogos do Santos. Mas o mundo do futebol, nunca foi para mim. Cheguei a fugir algumas vezes para ir embora para casa”.
Sucesso em São Januário
E o Santos não foi o único clube rejeitado por Tija, que fez o mesmo no Vasco da Gama, outra forte equipe da época. “Algum tempo depois, apareceu um empresário do Rio de Janeiro, o Augusto, e me levou para o Vasco. La eu me apresentei para Almir de Almeida – que era supervisor da CBD – Confederação Brasileira de Desportos (hoje CBF – Confederação Brasileira de Futebol). Fiz testes, muitos gols e passei. Eu ia começar a jogar. Só que, antes de sair de casa, em Moreira César, minha esposa Patrícia fez minhas malas e colocou a foto do meu filho ‘Patrick’ colada na parte de dentro da bolsa. Daí toda a vez que eu abria a mala, eu olhava a foto do Patrick pequenininho. Daí não teve jeito, falei para o goleiro Mazzaropi, que era meu companheiro de quarto, que estava indo embora para ficar com a família. Ele também não entendeu minha decisão, dai eu disse que não tinha condições de ficar longe de casa. Toda noite quando eu abria a mala eu chorava, era impossível ficar no Rio de Janeiro”.
Tija conta que depois ainda passou pelo Guarani, mas novamente não conseguia ficar distante.
O início
O talento de Sebastião Tadeu de Lima, conhecido como Tija, é hereditário. Seu pai, Ranulfo, também era jogador – foi artilheiro do São Paulo de Pinda e do Esporte Clube Roseira, onde atuou ao lado de Zito.
Nascido em Roseira, em 21 de janeiro de 1950, Tija demonstrava habilidade desde a infância, em roda de amigos e na escola. Sua carreira começou no EC Roseira, depois foi para a Esportiva de Guaratinguetá, onde jogou profissionalmente por dois anos e três como amador.
Origem do apelido
O apelido surgiu dentro de casa. “Eu era pequenininho, magrinho e meus pais e parentes ficavam falando ‘Bonitinho’, ‘Tinho’, daí virou ‘Tija’, e hoje o meu filho Patrick me chama de ‘Tijela’ ”.
Família
Sebastião Tadeu de Lima ‘Tija’ é casado com Patrícia Aparecida Corneti de Lima, sua grande paixão deste os tempos de escola. Eles possuem quatro filhos – Patrick Alessandro (pai de João Gabriel e de Enrico – que vai nascer em novembro), Patrícia Helena (mãe de Gustavo), Vanessa (mãe de Guilherme Henrique e Ana Luiza) e Viviam Maria.
Industrial de Coruputuba
Sua grande paixão no futebol sempre foi o Industrial de Coruputuba. “Cheguei como ponta direita, mas com o tempo fui ‘indo’ para o ataque e me consagrei no time titular. Lá ganhamos muitos títulos, como campeonatos municipais, regionais, até chegar a Campeão do Interior. Entre 1970 e 1976, ganhávamos tudo em Pinda e região”.
“Em 1975 chegamos à final do Campeonato Amador do Estado e foi uma confusão contra o Máquinas Piratininha – que já era bi-campeão. Eu não joguei aquela partida. Houve briga e o título ficou com eles. No ano seguinte fizemos a final com eles de novo, em campo neutro, no Morumbi, e fomos campeões”.
Tija lembra detalhes da partida e da preparação. “Foi uma semana de muita expectativa para nós do Industrial e toda a cidade. Eu não vinha treinando com o grupo porque estava com uma fratura no pé esquerdo. Joguei mesmo machucado. Fomos melhor durante todo o jogo. No segundo tempo fiz uma tabela com o Jaiminho, sofri o pênalti e pedi para bater. Bati no canto direito do goleiro, fiz o gol e conquistamos o título”, conta emocionado. “Era para ser uns cinco aquele dia. Coloquei duas bolas na trave, perdemos um monte de gol. O time estava unido, compacto, todo o elenco era bom, mas o nosso goleiro Marinho era incrível. Além dele, tínhamos um banco forte e os titulares eram Ito, Miranda, Tô e Tiago; Homero, Jaiminho, Kida e Lucas; eu e Bodinho”. A comissão ainda era integrada pelo técnico Alfredo Cozzi, pelo presidente Valter Navarro; pelo Dr. Brazão, roupeiro Julio e pelos enfermeiros Tião e Carlinhos.
Tija relata que mais emocionante que comemorar o título, foi a recepção que o clube teve na chegada a cidade. “Pinda levou alguns ônibus para São Paulo com nossos torcedores. E esses ônibus e muitos carros estavam parados na entrada da cidade esperando a gente chegar. Foi muita vibração. Fomos para o centro e a Praça Monsenhor Marcondes estava lotada”.
Bicampeão com o Corinthians
Depois do Industrial, onde Tija guarda as principais lembranças de atleta, ele ainda passou pelo Independente FC de Aparecida e pelo Corinthians do Alto Cardoso, clube pelo qual ele conquistou o bi-Campeonato Amador em 1982. “O Corinthians fez uma proposta e eu aceitei. Eu era contador de profissão, tinha filhos para criar e o futebol, ainda que amador, ‘dava uns trocados’. Naquele tempo a torcida também fazia uns agrados para os jogadores, além do ‘bicho’. O Corinthians era o atual campeão Amador e tinha uma verdadeira Seleção do Vale do Paraíba; o Industrial era mais local com gente de Pinda, Moreira e Roseira. Eram equipes distintas, jogavam de forma diferente. É difícil comparar, mas o Industrial era mais unido, era mais gostoso jogar lá; no Corinthians era mais profissional, mais sério, mais pressão”, explica.
A final de 1982 foi contra o Usina Junqueira, de Igarapava, onde o ‘Timão’ foi campeão. “Era um campeonato mais enxuto, com menos jogos, mas o que importava para mim era o meu segundo título Amador do Estado. Tenho muito orgulho de ter feito parte também da história do Corinthians”.
O Músico
Além de jogar futebol e de trabalhar como contador, Tija também foi músico e participou de um grupo chamado ‘The Friends’ entre as décadas de 1960 e 1970, onde a banda tocava coveres de artistas consagradados, especialmente dos Beatles. “Eu era guitarrista e a gente se apresentava em bailes de Pinda e região. Nunca foi de forma profissional, era mais por diversão”.
Arrependimento
Apesar de ter sido aprovado no ataque do Santos, na época de Pelé, e na forte equipe do Vasco da Gama, Tija não demonstra nenhum arrependimento por ter recusado os clubes. “Sempre conquistei meus objetivos de vida, tanto profissionais, quanto pessoais. O futebol sempre foi uma diversão, uma descontração, gostava de jogar, mas eu era um menino do interior, muito apegado à família. Sou mais feliz do jeito que as coisas aconteceram do que certamente eu teria sido se aceitasse ficar nos clubes por onde passei. Se eu tivesse ficado no Santos do Pelé, ou no Vasco, ou até ido para a Seleção, eu não teria sido tão feliz quando eu fui em Coruputupa, em Moreira, ao lado da Patrícia e dos meus filhos”, finaliza o artilheiro.