Lembranças Literárias : Lembranças Literárias
Um corvo arranjou um ninho em uma ilha muito distante, e quando teve filhos pensou em levá-los para o continente. Primeiro tomou um para com ele atravessar o oceano.
Chegando ao meio do caminho, porém, sentiu-se bastante fatigado e, diminuindo o voo, pensou de si para consigo: Agora que sou forte e ele fraco, posso perfeitamente levá-lo, mas quando a velhice vier bater-me à porta, lembrar-se-a do que lhe fiz?
E logo perguntou ao filho:
– Quando fores forte e eu perder as forças, levar-me-a assim?
Responde com franqueza!
O filho temendo que ele o deixasse cair, não vacilou em responder:
– Sim, levar-te-ei para onde quiseres!
Entretanto, o corvo não acreditou nas palavras do filho, e abriu as garras. Como uma flecha, o pequeno corvo caiu na imensidão do oceano e se afogou.
O velho corvo então rumou para a ilha, tomou o segundo, e começou a atravessar novamente o mar.
De novo sentindo se exausto fez ao outro filho, a mesma pergunta, obtendo idêntica resposta:
– Sim. É meu dever.
O pai também não acreditou e largou- o. Quando regressou à ilha, no ninho havia apenas um filho, tomou-o e dirigiu-se, como anteriormente, para o mar.
Fatigado, pela terceira vez, perguntou:
– Vais manter-me na minha velhice e transportar-me assim, quando eu não tiver mais forças?
Ao que o jovem corvo respondeu:
– Não!
-Por quê? Perguntou o pai.
Porque quando fores velho, eu serei forte, terei um ninho meu, e filhos para alimentar e transportar como hoje o fazes por mim.
Então pensou o velho:
– Este sim, disse a verdade. E por isso, em recompensa, vou levá-lo a outra margem.
E assim fez.
Tradução livre de T. Andrade
(Tribuna do Norte 2/11/1930)