Vanguarda Literária : O EU POÉTICO
Na construção dos textos, sejam contos ou romances, normalmente se estabelece uma diferença entre o autor que escreve o texto e o que narra a história; o autor ao não falar por si,cede a sua palavra ao narrador,assim como vemos diariamente nas novelas o autor deixar de ser ele para ser personagem.
Na poesia, em especial, o autor não fala, mas deixa uma voz enunciar o poema; constrói o que denominamos “ Eu lírico” ou “Eu poético” que vai dar o tom ao texto, embora os teóricos denominem o “ Eu lírico” como narrador personagem,é o sentimento mais profundo sobre algum assunto, sendo o “ Eu Poético” quem expressa o “ Eu Lírico” para as outras pessoas por meio da poesia. Na nossa rica literatura,o melhor exemplo, a melhor referência, é Fernando Pessoa( Lisboa-1888-1935), esse que foi considerado um dos maiores poetas da Língua Portuguesa e da Literatura Mundial.Ele não criou simples pseudônimos! Foi mais além! Criou vários poetas, personalidades poéticas, os famosos heterônimos, cada um com sua visão especial de mundo,seu estilo, sendo sobejamente conhecidos: ALBERTO CAIEIRO, ÁLVARO DE CAMPOS E RICARDO REIS. ALBERTO CAIEIRO é profundamente identificado com a natureza; o seu “ Eu Poético” revela-se em textos de linguagem simples,com o mundo das sensações , com o prazer,senão vejamos quando diz na obra ‘O Guardador de rebanhos:
“ Sou um guardador de rebanhos.
O rebanho é os meus pensamentos,
E os meus pensamentos são todos sensações;
Pensar uma flor e vê-la e cheirá-la”.
Por outro lado, ÁLVARO DE CAMPOS, outro heterônimo do Grande Poeta, é intensamente ligado ao mundo urbano e industrial,como pode mos apreciar em “ Ode Triunfal”:
“ Ah,poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Poder ir na vida triunfante
Como um automóvel último modelo!”
E, o que dizer desse fantástico heterônimo de Pessoa, o RICARDO REIS? Seu “ Eu Poético” em linguagem formal,se exprime na reflexão racional sobre o existir, sente as agruras do tempo, tem consciência ampla da inevitabilidade da morte.Percebemos que escreve totalmente diferente do bucólico CAIEIRO, do angustiado ÁLVARO DE CAMPOS, como podemos sentir nesses versos carregados de Filosofia:
“ Nem é porque eu sinta
uma dor qualquer.
Minha alma é indistinta,
Não sabe o que quer.
É uma dor serena,
Sofre porque vê.
Tenho tanta pena!
Soubesse eu de quê !”.
Por fim, relembro o nosso inesquecível escritor gaúcho Mário Quintana ( 1906-1994).,quando em “ Canção do Amor Imprevisto”,nos mostra o seu inigualável “ Eu lírico”,segundo alguns autores, o “ Eu Lírico masculino”:
“ Eu sou um homem fechado.
“ O mundo me tornou um homem egoísta e mau,
E a minha pessoa é um vício triste
Desesperado e solitário,
Que eu faço tudo por abafar.”