Nossa Terra Nossa Gente : O POETA GETULINO DO ESPÍRITO SANTO MACIEL
Ao ingressar no Ensino Superior, eu o encontrei pela primeira vez, secretário-geral da Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras de Lorena. Um gestor compenetrado, de olhos vivos, de brilho tão intenso que parecia destoar do cargo de elevada competência administrativa e burocrática que ocupava. Aquele homem de espírito perspicaz era o cérebro da instituição (e o coração também!): criava e instalava cursos, cuidava da aprovação e registro desses no MEC, redigia documentos, atendia prontamente alunos e professores. Sua assinatura – Getulino do Espírito Santo Maciel – está estampada no verso do meu diploma de Licenciatura em Ciências/Matemática, e, todas as vezes que a espreito, a lembrança de seus olhos “de muitas estrelas” leva-me a inquirir: o que os olhos do Getulino escondem e que eu tanto sei sem saber ainda?
Anos depois, a jovem professora de Estatística da Faculdade Salesiana encontra novamente os olhos do Getulino, agora, meu colega de trabalho (ele era professor na Filosofia) e, também, pai do meu aluno Alberto – um querido até hoje! Olhos amorosos de pai cujo brilho se destacava dentre os olhos de outros pais dos alunos que tive a honra de conduzir pelos caminhos da ciência dos números até suas formaturas! No verso dos diplomas de cada um deles (Filosofia, Ciências, Letras, História, Geografia, Pedagogia, Psicologia e Direito) estava a assinatura do Getulino, e, no verso do verso de sua caligrafia, o homem responsável pelas oportunidades profissionais que se abririam às gerações de egressos da Faculdade Salesiana de Lorena.
Quatro décadas se passaram, e, um dia, o véu que encobria o mistério dos olhos do Getulino se descortina nas janelas de sua página do Facebook: Getulino era poeta! Poeta dos grandes! Poeta da mesma comitiva de Guimarães Rosa pelas Gerais; poeta da mesma alma bipartida do Drummond, da burocracia à poesia; poeta da mesma mística espiritualista de João da Cruz! Os versos e as crônicas postados por Getulino (https://www.facebook.com/getulino.maciel.1), dia a dia, revelavam-me o que estava escondido nos olhos daquele secretário-geral que assinara meu “passaporte” para o ofício de professora de matemática e que, desde que nos conhecemos, percebia que neles havia “um sol que nunca se põe e uma lua que não para de brilhar.”
Em 2020, ano em que o poeta Getulino celebrou suas oitenta primaveras (13 de maio), seus parentes e amigos foram agraciados com dois presentes de inigualável valor: “Entre caminhos e afetos”, seu livro de poemas, e “Aqui estou”, seu livro de crônicas, ambos de uma beleza poética que deixaram meus pés arrebatados do chão! Agora, sim, eu sei o que os olhos de Getulino me diziam sem dizer!
Lendo seus livros (companheiros de minhas inquietações filosóficas durante esse tempo de confinamento social imposto pela pandemia da Covid-19), descobri o que via sem ver dentro dos olhos do gestor universitário; dentro dos olhos amorosos do esposo da estimada Professora Celina, colega do “Arnolfo Azevedo”, e do pai do meu aluno “Beto” (e também da Angélica e do Alexandre); dentro dos olhos que, entristecidos pela morte da esposa, encontra outros olhos amorosos a zelarem pelos seus, os da bibliotecária Maria de Lourdes Camelo!
Dentro dos olhos de Getulino mora um menino poeta, nascido no dia de Pentecostes, no planalto goiano, em Morrinhos, filho de Antonio Lopes Maciel e de Zulmira de Moraes Maciel e que, desde pequenino, “carrega água na peneira” e, como Manoel de Barros, “é poeta a vida inteira”, poeta das coisas miúdas, dos que ficaram esquecidos à margem dos caminhos, dos passarinhos que “avoam” de viver entre nós!
Oitenta primaveras de fecunda poesia! Parabéns, Getulino! Nesse ano atípico, fico lhe devendo o abraço de muita saudade e, também, uma visitinha mineira, daquelas que adentram a tarde em torno da mesa de café com as deliciosas quitandas de Lourdes, em que dividimos as lembranças dos bons tempos e dos velhos amigos, o amor de nossos cães, os retratos das viagens, as histórias colhidas aqui e acolá. Por ora, estimado amigo, receba o abraço repleto de poesia, de gratidão e de imensurável amor.
Aos leitores de Nossa Terra, Nossa Gente, partilho um presente – ACORDES, poema que nos remete: à sua terra natal (“Você sabe onde fica Morrinhos? Ali, onde o sol começa a não se apagar mais”); ao Goiás de Cora Coralina; ao jovem goiano que veio estudar nos seminários de Aparecida e de São Roque e pelo Vale do Paraíba se encantou, enamorado pela vida inteira!