Qual o seu talento? – Artista plástico trabalha no resgate de esculturas religiosas tradicionais
Inspirado no trabalho do seu pai, Felipe Callipo concebe sua carreira com a produção de obras sacras
Colaborou com o texto: Dayane Gomes
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“Nunca planejei ser, só sou”. Deste modo, o escultor se vê em meio a barro, tintas, latas e pincéis e se insere na procissão artística de consolidação cultural, mista de tradicionalismo e atualidade. O católico crismado veio de Mogi das Cruzes na adolescência e reside em Pindamonhangaba há 25 anos. Atualmente, aos 39 anos de idade, é casado, tem uma filha e sua vida profissional direciona-se em trabalhar como professor em uma escola pública e fabricar elementos da arte barroca paulista através de técnicas aprendidas com seu pai, Sergio Callipo, e formalizadas na faculdade de artes plásticas e na pós-graduação em História da Arte. Assim, envolto à arte sacra e arrebatado pelo talento hereditário, Felipe Callipo põe a mão na massa para a customização de, em média, 100 obras por ano, que são expostas em museus e salas de arte pelo Brasil afora.
Foi caminhando naturalmente, entre seus 17 e 18 anos de vida, que Felipe percebeu sua disposição inata para ser artista plástico. Era inevitável se identificar com a atividade paterna, uma vez que sempre acompanhou as produções de Sérgio Callipo. Até hoje, seu pai permanece como seu grande mestre. Inclusive, a proximidade entre os dois é geográfica, eles moram na mesma rua do bairro Jardim Boa Vista, onde o artista também mantém seu ateliê há, aproximadamente, 10 anos.
Nos fundos de sua moradia, é onde o “Callipo Filho” trabalha em esculturas com qualquer tipo de material, entre eles, isopor e resina. Porém, a matéria-prima mais usual é o barro. “Pedra é muito cara, pesada e complicada de achar na região. Madeira boa é madeira de lei, que, hoje em dia, é ilegal extrair para esse fim. Então, o que se tem facilmente e faz parte da tradição é a argila”, explicou o artífice. Usualmente, ele fala olhando para as suas produções. Sua voz calma e tímida entrega sua personalidade pacífica. “Não dá para você ser nervoso e tentar trabalhar com escultura. Ainda mais escultura em barro”, certificou.
“É uma coisa que o barro dá para a gente, essa tranquilidade, paciência. Você tem que ir trabalhando nele aos poucos. E eu trago isso para a vida, não adianta querer resolver tudo de uma vez só, porque não é assim que funciona.”
Influências artísticas
Além da inspiração paterna, Felipe Callipo carrega o Frei Agostinho da Piedade e o Frei Agostinho de Jesus como referências artísticas para a concepção de peças religiosas com aspectos tradicionais combinados à recursos contemporâneos. Sendo que, a arte sacra consiste em sua linha produtiva principal, apesar de também esculpir, ocasionalmente, artes populares voltadas ao folclore brasileiro. Posto que, seu trabalho corresponde à demanda de exibições públicas e de vendas particulares.
“Hoje, eu trabalho mais com encomenda. Todas as peças estão à venda. Estou trabalhando há um ano para juntar um acervo, se não, não consigo fazer exposição”, comentou o escultor que tem entre os santos mais retratados São Benedito, São Francisco de Assis e seu discípulo São Francisco de Paula.
Aliás, mesmo morando há tanto tempo em Pindamonhangaba, Callipo acredita que o apoio e a aceitação de seu exercício no campo da arte se encontram mais fora do município. Suas exposições acontecem em salas de artes e museus, raramente em igrejas, localizadas além dos limites do Vale do Paraíba. Em seu histórico, o artista plástico conta com mostras no Rio de Janeiro, em Minas Gerais e São Paulo, “do Litoral Sul até Cunha”, conforme suas palavras. Igualmente, esses são os principais pontos comerciais de saída das suas produções, que já foram vendidas para Brasília, Europa e Estados Unidos. “A grande maioria da minha clientela são padres”, explicitou.
Empenhos além da arte
Felipe Callipo não tem tanta intimidade com tecnologias como possui com a argila, por isso dispõe da ajuda da esposa para divulgar suas peças na página do seu ateliê, a “Oficina do Barro”, em uma rede social. “Acho que os artistas deveriam se conectar um pouco mais a essa nova realidade. Seria legal ter mais interação entre esse público que cria e esse público que consome a arte”, comentou.
Até porque, parte do seu ofício engloba o gerenciamento da própria divulgação para conseguir chances de expandir sua zona de evidenciação. “Eu exponho onde me abrem as portas. Nunca nego um convite”, frisou. Em grande parte, a razão das dificuldades de exibição está ligada à falta de amparo à cultura, são as conhecidas “portas fechadas”. Em ambientes públicos, principalmente, Callipo considera que “as pessoas preferem ter uma exposição de um artista morto, do que valorizar um artista em vida. Isso é uma realidade muito triste, pois não temos espaço para expor”.
Mesmo acompanhando o cenário de impedimentos culturais no Brasil, o artífice lembra com felicidade de um grande feito da sua carreira em uma das maiores festividades nacionais. Ele trabalhou em uma edição do carnaval, fazendo esculturas em alegorias das escolas de samba “Unidos de Vila Maria” e “Gaviões da Fiel”. “Foi um aprendizado enriquecedor, porque são esculturas muito grandes e de isopor. Nunca tinha imaginado como eram feitas”, contou.
“Eu almejo passar para alguém essa arte.
Eu espero conseguir dar continuidade aos aprendizados que recebi do meu pai.”