História : Relembrando o inesquecível “João Romeiro”

Nascido a 26 de maio de 1842, o fundador do jornal Tribuna do Norte sempre foi relembrado nas páginas de sua folha que já comemorou duas passagens de século

Encerrando maio, mês que neste ano marca 181 anos do nascimento do Dr. João Marcondes de Moura Romeiro, advogado, juiz, político, jornalista, escritor, poeta, célebre criador deste secular periódico, a página de História de hoje, com o intuito de cultuar-lhe a mémória, se vale da pena de um cronista de sua convivência que escrevia sob o pseudônimo “João de Pinda”.
O interessante artigo, publicado na Tribuna, edição do dia 11 de junho de 1938 (o jornal completava 56 anos de existência), segue abaixo, na íntegra:

A galeria de homens ilustres de Pindamonhangaba, daqueles que logram engrandecê-la pelas suas virtudes cívicas, pela nobreza de coração e pelos seus méritos intelectuais, deve figurar, entre outras grandes figuras, em primeiro plano o saudoso pindamonhangabense Dr. João Marcondes de Moura Romeiro.

Quem, como nós o conheceu na intimidade não pode deixar de relembrá-lo, em um grande enternecimento de alma e sem uma imensa saudade.

Caráter leal e franco, que às vezes era levado a conta de arrebatado, possuia um coração adamantino e humilde e sempre aberto para os amigos e até para os inimigos.

Mas que dizemos! O Dr. João Romeiro, aquele nobre e bom velhinho, não tinha inimigos em Pindamonhangaba, sua terra natal, apenas tinha contradictores políticos, que ainda asssim, muito admiravam o seu caráter inatacável e a sua franqueza que era filha da serenidade mais genuína.

Possuindo um invejável cabedal de informações e sendo um profundo jurisconsulto – era simples nas conversações e jamais fazia alarde do seu saber, deixando essa tarefa aos admiradores do seu másculo talento, admiradores esses que não eram só os habitantes de Pindamonhangaba, mas todos os que conheciam as suas obras de literatura ou direito.

Era enérgico, cavalheiresco e sobretudo de uma honestidade a toda prova. E assim é que, como advogado, antes de constituir-se patrono de uma causa, indagava da justiça da mesma, porque se esta era injusta não a patrocinava; e se a tomava, quando justa, não cogitava da sua proporção e nem das possibilidades financeiras do seu constituinte, pois fazia da advocacia um sacerdócio e não uma fonte de riqueza.

Acolhia no seu escritório de advogado que era ao mesmo tempo sala de visitas e de leitura, a todos quanto o procuravam, grandes e pequenos, sempre risonho e afável, como só o sabem fazer grandes almas.

Do Dr. João Romeiro poder-se-ia dizer que era uma perfeito seguidor daquelas pequenas e grandes virtudes das quais nos fala o sábio jesuíta ‘Padre Roberti’: possuia um tesouro de indulgência no coração e assim é que perdoava as faltas do próximo, mesmo quando não podia esperar um igual procedimento do outro; possuia certa arte de dissimular as fraquezas alheias parecendo não percebê-las, para não humilhar o fraco; possuia uma dessas compaixões que fazem sentir como próprias as tristezas dos infelizes e do mesmo modo a alegria dos felizes; no primeiro caso suavizando as penas dos que sofrem, e no segundo aumentando a felicidade dos que gozam; possuia a docilidade que abraça sem resistência as ideias justas do semelhante, aprovando os seus pensamentos e elogiando-os, sem inveja; possuia certa deligência em prevenir as necessidades dos outros, poupando-lhes o desgosto de os fazer experimentar as humilhações de pedir socorro; possuia certa liberalidade de coração que o levava sempre a fazer tudo em benefício do próximo e desejar poder fazer ainda mais; tinha inata a afabilidade tranquila que atende os importunos sem enfado, e instrui os simples sem repreensões; possuia, finalmente, aquela urbanidade que o levava a cumprir os deveres da civilidade, sem essa dissimulação graciosa que se usa no mundo, mas com uma cordialidade ingênua e toda cristã.

O Dr. João Romeiro levava uma vida patriarcal, e feliz, de manhã à noite no seu escritório repleto de objetos curiosos, de livros raros e jornais de quase todos os cantos do Brasil, rodeado sempre dos filhos carinhosos e de amigos, tanto de alta como de ínfima categoria.

Foi um pindamonhangabense ilustre em toda a extensão da palavra, um chefe de família modelar e um digno filho da igreja católica, em cujo seio morreu sob as bençãos do Senhor e de todos os seus conterrâneos.

Contou-nos o vigário da paróquia de então, que era o reverendo padre Loyello Bianchi, a nós que chegavámos a Pindamonhangaba, de regresso de uma longa viagem:
– Morreu o Dr. João Romeiro. Morreu como um santo, meu amigo. Fez uma confissão edificante, recebeu os Sacramentos da Igreja, e, rodeado da família, entregou a grande alma ao criador, tranquilamente, numa admirável paz, como se fora uma criança.
E rematou: – Era uma alma de eleição… mas também, como não ser assim, se foi um homem que, durante toda a vida, outra coisa não fez senão o bem, indistintamente a todos que o procuravam?….”

Nota: Ninguém melhor capacitado pra comentar o tipo inesquecível que fora uma pessoa senão alguém que tenha convivido com ela…

  • Arquivo TN. João Romeiro morreu aos 73 anos, no dia 8 de julho de 1915. Sobre a sua partida, comentou o reverendo padre Loyello Bianchi, então vigário da Paróquia Nossa Senhora do Bom Sucesso: “- Morreu o Dr. João Romeiro. Morreu como um santo, meu amigo. Fez uma confissão edificante, recebeu os Sacramentos da Igreja, e, rodeado da família, entregou a grande alma ao criador, tranquilamente, numa admirável paz, como se fora uma criança...”
  • Arquivo TN. “Acolhia no seu escritório de advogado que era ao mesmo tempo sala de visitas e de leitura, a todos quanto o procuravam, grandes e pequenos, sempre risonho e afável, como só o sabem fazer grandes almas...”