Nossa Terra Nossa Gente : Vitor Bernardes Valentini: Alma de cientista, coração de “menino-passarinho”
Vi, pela primeira vez, Vitor fotografando as aves da Fazenda Nova Gokulae fiquei impactada com aquele “espécime rara” de menino. Na minha juventude, os garotos de sua idade estariam com estilingues e espingardas, gaiolas e alçapões para matar ou aprisionar as criaturinhas aladas. Vitor Valentini, ao contrário, realizava um sério trabalho: naquele dia, observava e registrava o maior número possível de pássaros daquele santuário ecológico de sua terra natal. Na verdade, aquela era uma atividade da prova Global Big Day criada pelo Laboratório de Ornitologia de Cornell, nos EUA.
O respeito ao trabalho científico que ele realizava impediu-me de ir ao seu encontro e saber como ele havia sido despertado para amar os pássaros e o que ele tinha para nos ensinar. Esta conversa demorou quase três anos para acontecer pois este birdwatcher (observador de pássaros), assim como muitas aves, tinha rotas distintas nos invernos e nos verões: Vitor migrava do Brasil para a América do Norte, no período de suas férias escolares, para colaborar com as pesquisas de renomados cientistas eornitólogos americanos.
Em nosso encontro, confidenciou-me que um episódio de sua infância marcou o início de sua paixão pelas aves: durante um passeio à uma fazenda com o pai, ele avistou um pardal preso nas teias de aranha das réguas do curral e, atendendo ao seu pedido, o pai resgatou o passarinho e o colocou na mão de Vitor para que este tirasse a trama mortífera do corpo da avezinha e a soltasse de novo ao céu. Este pequeno ato, misteriosamente, prendeu o coração de Vitor! Desde então, aquele menino de cinco anos, tomou para si o desejo de proteger estes maravilhosos pequenos seres e a Natureza.
Seus pais, Adriana e Wilson Valentini e, também, Alice, sua irmã caçula não medem esforços para ajudar Vitor em sua tarefa de cuidar dos passarinhos que vivem nos arredores de onde moram! Em sua casa há água, frutas e sementes à vontade para os pequeninos e, também, ninhos pendurados sob o beiral do telhado e no jardim. Além do alimento farto e da moradia garantida, na época da criação dos filhotes, há um “anjo sem asas” para protegê-los de predadores naturais (gatos, ratos e corujas) e de outros inimigos mais vorazes.
Aos 17 anos, o jovem colecionador de obras raras de ornitologia e de um minimuseu natural discorre sobre os autores estudados, as espécies catalogadas no bosque do condomínio em que mora, das palestras e conferências que ministra nas escolas e congressos científicos e, ainda, das diversas tarefas que ele executa no Laboratório de Ornitologia de Cornell com a desenvoltura de uma exímio cientista.
Ao finalizarmos a entrevista, percebo o micro aparelho auditivo de Vitor. Descubro que ele é 100% deficiente auditivo e desacredito! Observador atento, ouve e distingue o canto de todos os pássaros que emitiram sons enquanto nós passeávamos e conversávamos. Assim como os beija-flores, meu coração para de bater por alguns segundos. Estou diante de uma grande alma. Sorvo o néctar de seu incondicional amor à Natureza e às aves e agradeço! Que o seu voo, Vitor Valentini, seja tão alto e longínquo quanto foi o de outro brasileiro, o ornitólogo Johan Dalgas Frisch. E que as aves do mundo inteiro possam ser abençoadas por sua alma de cientista e por seu coração de “menino-passarinho”!